Nas sociedades antigas, os sábios cultivavam o saber como critério para atingir a felicidade, entendendo este sentimento envolvente como a busca constante da paz interior. Muitos destes sábios atingiram essa tão preciosa paz, embora cercados pela indiferença da maioria da sociedade, que pretendia encontrar a paz através do acúmulo de riquezas materiais. Pelo contrário, os sábios antigos desprezavam essa acumulação, e viviam frugalmente, sem nenhuma preocupação com a riqueza, a ambição e a voracidade, fatores de tantas infelicidades, que beneficiam sempre as minorias dominantes, exploradoras da maioria da população. E as sucessivas civilizações reproduziram a exploração das minorias sobre as maiorias. É evidente que ao longo dessa trajetória, as maiorias se rebelaram contra essa exploração e trocaram os donos do poder, mas rapidamente essas novas minorias restabeleceram regimes discricionários que os beneficiava. E assim caminha a humanidade, dividida entre poucos ricos, alguns remediados, e incontáveis explorados, que só lentamente conseguem obter uma migalhazinha a mais de toda riqueza que o seu trabalho produz. Atualmente, essa maioria explorada está deslumbrada com a sociedade altamente tecnológica que desenvolveu, sempre com seu trabalho, mas que apesar da melhor redistribuição das riquezas, ainda reproduz muita miséria e infelicidade entre a maioria da população, enquanto as minorias privilegiadas continuam desfrutando de um padrão de vida material negado para a coletividade. Se até recentemente a capacidade de exploração das minorias era mantida através da força bruta das instituições encarregadas de zelar pela segurança dos ricos e poderosos, atualmente este privilégio acontece através da persuasão e do engodo exercidos sobre a maioria, hipnotizada pela visão de que o consumo generaliza-se cada vez mais, e quando atingir o conjunto da população, seremos todos felizes. Ao prometer através da propaganda hipnótica, reproduzida pelos meios de comunicação, a proximidade dos tempos felizes para todos, as elites dominantes mantêm-se no poder explorando a coletividade, e acelera a formação de uma sociedade na qual o consumo generalizado de tudo o que a indústria produz é o ideal de felicidade. Envolvida pelo brilho e o barulho ensurdecedor da sociedade movida pelos motores, e acelerada pela tecnologia, a maioria é conduzida a pensar e sentir a vida futura como um universal supermercado, no qual tudo, até a felicidade, se transforma em mercadoria. Iludida por esta promessa, quando então estará satisfeita, bem nutrida, com saúde e longa vida garantidas, a coletividade supõe ter finalmente atingido o paraíso, e talvez até a eternidade nesta vida. Mas esta esperança é enganosa, e o resultado final de toda esta febril concepção de vida consumista afetará muitos viventes, entediados ou ansiosos com o produto final do consumismo indiscriminado.
Os isolados sábios contemporâneos apontam o final catastrófico desta ilusão: -em nome do consumo generalizado, além de explorar sistematicamente as maiorias, a civilização contemporânea em pouco mais de duzentos anos conseguiu devastar o planeta Terra através de uma agressão jamais presenciada nas civilizações anteriores. E alertam que as fronteiras ainda sadias do nosso meio ambiente serão as próximas vítimas da sandice consumista. Então, quando consumada a agonia do planeta, a vida aqui na Terra será impossível para qualquer vivente. É preciso conter essa devastação suicida, mas para essa contenção é fundamental que a humanidade ouça a voz da razão dos nossos sábios. E para essa reversão é necessária uma revolução cultural, que inverta os objetivos consumistas da nossa sociedade, substituindo-os por valores humanos a serviço da vida e não da destruição. Podemos viver felizes sem consumir as bugigangas produzidas pelo capitalismo voraz, se preocuparmos com a qualidade de vida de cada vivente, desenvolvendo nossas qualidades humanas, hoje sufocadas pela ansiedade do consumo. Mas para essa inversão, precisamos prestar atenção à vida frugal e meditativa dos sábios de todas as épocas, que enfatizam a simplicidade, a tolerância, a amizade, e sobretudo a solidariedade entre a humanidade. Se a cultura consumista não caminhar nestes rumos, será apenas uma ressaca cultural.