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Nas civilizações antigas, profetas, videntes e místicos foram os porta-vozes dos mais profundos anseios da humanidade, e através de seus ensinamentos construíram um oásis de dignidade à vida, em sociedades brutalizadas e injustas para a imensa maioria da população. Falaram em nome de Deus, para eles considerado um princípio vital de amor, da bondade e da solidariedade que deve imperar entre a humanidade. Mas eram vozes isoladas, que ensinavam a uma maioria indiferente aos seus ensinamentos. Essas personalidades tinham um comportamento estranho ao quotidiano, pois suas mensagens libertadoras tornavam os profetas, os videntes e os místicos incompatíveis com o estilo de vida da maioria. Falavam em nome de Deus, mas repudiavam as religiões institucionalizadas, pois consideravam-nas uma fonte antidivina, já que, para esses pregadores, suas práticas conduziam os crentes à idolatria e aos ritualismos cerceados por dogmas, práticas contrárias à libertação plena da humanidade, desejada por Deus. Seus ensinamentos contrariavam as condutas dos sacerdotes profissionalizados, e motivavam as iras dos membros dos corpos eclesiásticos. Perambulando maltrapilhos pelas ruas das cidades, ou isolados nos inóspitos desertos, alimentando-se frugalmente e desdenhando a riqueza, o luxo e a exploração dos humildes pelos opulentos, profetas, místicos e videntes alarmavam a coletividade com suas mensagens radicais, que prometiam a bem-aventurança aos seguidores dos princípios divinos e os castigos aos idólatras de vida desregrada. O universalismo de seus princípios chocava-se muitas vezes com o etnocentrismo das religiões exclusivistas, que desejavam o monopólio das verdades para si, e perseguiam os seguidores das religiões de outros povos. Não aceitavam a transformação dos princípios divinos em doutrinas, pois estas desfiguravam o radicalismo, a amplitude e a generosidade de suas mensagens abertas e assimiláveis a todo homem de coração aberto, e fraterno ao próximo.
Nas civilizações ocidentais antigas, profetas, videntes e místicos tiveram como seus continuadores os filósofos, pensadores menos emotivos e mais racionais, que prometiam a felicidade plena a quem se guiasse na vida pela Razão. Eram também intransigentes a qualquer concessão à irracionalidade, e primavam pela ética na maneira de adquirir conhecimentos. Embora menos extravagantes que os profetas, místicos e videntes, os filósofos tinham uma vida modesta, dedicada à meditação sistemática e aos ensinamentos que proporcionavam aos seus alunos, preparando-os para a cidadania. Eram mais sedentários e menos itinerantes que os profetas, místicos e videntes. Embora integrados à sociedade onde viviam, os filósofos eram também vítimas de sua coerência, pois, ensinando a prática do universalismo e da solidariedade entre os povos, chocavam-se com os interesses das classes dominantes, defensoras de um patriotismo agressivo e imperialista em relação aos povos vizinhos.

Através do racionalismo filosófico, os filósofos são os fundadores do racionalismo científico predominante em nossa sociedade, e anteciparam as condições culturais para o surgimento das ciências e da tecnologia, campos de conhecimento mobilizados pelos cientistas. O racionalismo das ciências é impulsionado pelo racionalismo lógico, que gera novos conhecimentos responsáveis pelo alto nível de cultura e de desenvolvimento da nossa sociedade. Na aparência ou na superfície das ciências não há espaço para as preocupações
fundamentais dos filósofos ou os místicos, videntes e profetas, como a indagação sobre a natureza humana, qual conduta ética nos conduzirá à felicidade plena, ou como tornar a vida digna de ser vivida. Mas apesar das atenções dos cientistas se voltarem quase que exclusivamente para suas pesquisas, os resultados de suas atividades científicas criam uma sociedade mais humana, e mais racionalista, que estimula a liberdade de expressão e repudia o cerceamento do conhecimento nos limites das doutrinas.
O universalismo da cultura contemporânea está contribuindo para o surgimento de pensadores radicais e humanistas, como o psicanalista Erich Fromm, que no século passado construiu um sistema filosófico centrado tanto nos ensinamentos dos profetas, místicos, videntes, filósofos e cientistas, mas integrando todos esses personagens no radicalismo do humanismo contemporâneo. Para Fromm, embora os videntes, os místicos e os profetas pregassem em nome de um Deus universal, os filósofos ensinassem em nome da Razão universal, e os cientistas pesquisem através do racionalismo lógico, todos esses ilustres construtores da humanidade são humanistas, pois o centro de todos esses sistemas foi sempre o Homem, considerado “a medida de todas as coisas.” É neste sentido que Fromm postula o surgimento de “Um sistema Homem”, que acople os ensinamentos produzidos por profetas, videntes, místicos, filósofos e cientistas, sem ser exclusivamente religioso, filosófico ou científico. Esta é uma visão holística da humanidade, adequada à globalização da sociedade contemporânea, que caminha para um universalismo planetário.

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