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A eleição presidencial de 2018, foi talvez um dos últimos capítulos do embate entre a direita e a esquerda tradicionais, que duelam desde 1930 no cenário brasileiro, quando Getúlio Vargas viabilizou seu modelo de governo positivista.
Daquele período até a última eleição presidencial entraram e saíram de cena inúmeros partidos políticos, formados ao sabor de interesses oligárquicos, e desgastados pela sua falta de identidade ideológica com o dinamismo da realidade brasileira. Até 1964, as esquerdas e as diretas continuaram os principais antagonistas no cenário político nacional, em um ambiente político anuviado pela divisão geopolítica das nações em dois blocos antagônicos, o comunista liderado pela União Soviética e o capitalista liderado pelos Estados Unidos. Esta divisão rígida bloqueava a iniciativa política de muitas nações emergentes da África, Ásia e América, inclusive o Brasil, que pretendiam se tornar independentes da influência de um dos blocos beligerantes. Como esta política independente era programa dos partidos de esquerda, eles encontravam forte oposição dos partidos conservadores de direita, que os acusavam de comunistas. Em resposta a esta acusação, as esquerdas denunciavam a direita como cúmplices do imperialismo americano e responsável pelo atraso estrutural do país. Este clima ideológico tornou-se insustentável quando o presidente João Goulart, que sucedeu ao renunciante Jânio Quadros, decidiu realizar as reformas de base necessárias ao desenvolvimento da sociedade brasileira, mas encontrou forte oposição de significativos segmentos das classes conservadoras, formadas por banqueiros, latifundiários, exportadores e empresários vinculados aos interesses estrangeiros no país. Diante dessa crise que dividiu a sociedade brasileira, as forças armadas protagonizaram o golpe de 1964, que colocou na ilegalidade os partidos políticos existentes e estabeleceu o sistema ditatorial que vigorou no país até 1982, quando a democracia representativa voltou à plena legalidade. Como a ditadura militar identificou-se com a ideologia de direita, proporcionou às esquerdas liberais e democratas o espaço político para reivindicar o retorno à democracia, e a oportunidade de governar a sociedade brasileira segundo sua ideologia. Divididas em várias tendências, das neoliberais à social-democracia, as esquerdas albergavam também em seu interior um segmento identificado com o socialismo democrático, visível no PT, mas que não se tornou hegemônico em seus governos, cujas ações políticas estiveram mais próximas do populismo positivista de Getúlio Vargas.
Nas últimas eleições presidenciais, o derrotado pelo voto popular foi esse populismo getulista do P.T., e o vencedor foi a extrema direita ideológica, que através do amorfo bolsonarismo proporcionou voz aos segmentos menos politizados da sociedade brasileira. Apesar do seu brilho inicial, em apenas pouco mais de um ano de governo o bolsonarismo demostra sinais visíveis de esgotamento devido à evidência de que seu autoritarismo conservador é impraticável em uma sociedade moderna, globalizada, na qual a pedra de toque é o regime democrático representativo, e não a vontade absoluta do presidente.
Parece-nos que nesta eleição, a derrota do PT confirmou o esgotamento do governo estatizante do getulismo positivista. Mas ao sagrar-se vitorioso, o bolsonarismo demonstrou que o autoritarismo da extrema direita também está esgotado, pois sua ideologia é remanescente das décadas de 30, quando floresciam os regimes políticos autoritários. Essa morte dos adversários de ontem no mesmo campo de batalha, demonstra que o Brasil moderno precisa seguir a cartilha dos países democráticos mais avançados do ocidente, e abandonar as teses do terceiro-mundismo.
Os últimos lances de Bolsonaro sutilmente efetuados no tabuleiro político nacional podem indicar que o presidente prepara-se para fazer de sua ala extremista liderada pelo místico Olavo de Carvalho apenas um estandarte ideológico, mas nos bastidores negocia com o centrão um confortável apoio que sirva de apoio para negociar com o Congresso. E se a aventura tiver sucesso, costurará com Paulo Guedes uma distorção no plano liberal do ministro, para que sua ortodoxia se flexibilize e conceda uma fatia suficiente para o presidente realizar programas de renda mínima para ter a população de baixa renda ao seu lado nas próximas eleições presidenciais, já que está perdendo visíveis apoios entre o eleitorado liberal e de classe média que o elegeu. Se estes últimos lances do governo se concretizarem, veremos em breve o ressurgimento do populismo no Brasil, agora promovido por um líder de direita. E quem votou em Bolsonaro contra o populismo do PT assistirá encabulado seu salvador cometer o mesmo pecado do adversário. Se a sociedade brasileira deseja superar seu atraso econômico e cultural, precisará antes superar o seu atraso eleitoral, e votar em candidatos identificados com a social democracia e não movidos artificialmente por projetos messiânicos.

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