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Precisamos resistir a qualquer manifestação de violência, física ou moral, explícita ou simulada, individual ou coletiva. Ao longo da vida civilizada, os povos elaboraram legislações para mediar as demandas individuais e coletivas para evitar a violência tanto retaliadora como defensiva, evitando que as divergências pessoais ou coletivas se transformassem em uma prática cotidiana inserida na sociedade. Entretanto, o aperfeiçoamento dessas legislações não conseguiu pacificar o convívio humano, nem impedir a proliferação da violência que contamina todo o tecido social da vida civilizada, e muitas vezes torna-se uma prática consensual, tolerada pela maioria da sociedade, apática em relação aos constantes atos de violência ocorridos no cotidiano. Atualmente considerada uma inadmissível prática de violência, o trabalho escravo era uma instituição aceita nas sociedades antigas, e justificada até por filósofos da estatura de Aristóteles, que não consideravam uma violência escravizar um ser humano, transformado em um instrumento de trabalho para o enriquecimento das minorias dominantes. Críticos do trabalho escravo, não somos isentos de preconceitos em relação ao trabalho assalariado em nossa sociedade, que consideramos uma forma racional de emprego, decorrente de um acordo entre capitalistas e assalariados, e não um critério de exploração do trabalhador consensualmente aceito na sociedade capitalista. Tanto na sociedade antiga como na moderna, o trabalho dominante (escravo no período antigo, e assalariado no período atual)- são consensuais porque historicamente são indispensáveis para a sustentação da sociedade onde são predominantes. Apenas os raros visionários de cada época desenvolvem uma consciência crítica da violência que essas formas de trabalho representam, e propõem a vigência de um trabalho mais humano, centrado nos interesses coletivos, e não prioritariamente nos privilégios das classes dominantes. Atualmente, nossa cultura universalista permite que os visionários definam o trabalho escravo ou assalariado como critérios de exploração que geram as violências disseminadas na sociedade onde predominam. O racismo dirigido contra os negros nos Estados Unidos, é uma violência decorrente da escravidão, que vigorou principalmente nos estados sulistas, e se infiltrou como uma ideologia no conjunto dessa sociedade. Está presente não somente na consciência de uma parcela de sua população, mas também em muitas instituições desse país, como em parcelas significativas dos seguidores do Partido Republicano e nos setores de segurança pública. Esse racismo é uma ideologia perversa, que justifica o ódio aos negros, e os consideram pertencentes a uma raça inferior, à qual a sociedade dominante destina os piores empregos, as habitações de última classe, nos bairros periféricos, e que merecem ter uma vida segregada da maioria branca. Essa mentalidade racista, manifestou-se recentemente, em uma das ruas da cidade de Minneapolis, quando um policial branco assassinou por asfixia George Floyd, um cidadão negro, mas aflorou a consciência coletiva de parcelas significativas da população norte-americana contrárias à ideologia do racismo, e desencadeou uma prolongada onda de protestos, que se espalhou pelas ruas desse país, e alcançou as ruas das capitais de vários países europeus. Os manifestantes reivindicaram mudanças nas leis que facilitam a prática do racismo nesse país, defenderam o direito de igualdade do negro como cidadão norte-americano, e demonstraram como a questão racial ainda traumatiza os Estados Unidos. Estas manifestações de rua, certamente influenciarão os resultados das eleições presidenciais deste ano, principalmente porque o presidente Donald Trump, um republicano conservador, se conduziu muito mal durante os protestos, e desagradou parcelas significativas do eleitorado desse país. Se a vitória sorrir para os democratas, partido onde a condenação ao racismo está sedimentado, provavelmente o novo presidente defenderá uma agenda progressista, que contribuirá para esvaziar os bolsões reacionários que abrigam os segmentos racistas desse país. Mas como as origens do racismo norte-americano estão enraizadas no trabalho escravo do negro, essa nódoa histórica ainda mancha a consciência de parcelas de sua população, e se manterá viva enquanto o negro não tiver acesso aos empregos mais qualificados e às universidades desse país. E para atingir esse equilíbrio social, é fundamental a transformação dessa sociedade aprisionada pelos interesses dominantes do capitalismo financeiro, em uma sociedade pacificada, onde o trabalho assalariado se transforme em uma atividade produtiva compatível com as aptidões de cada trabalhador. Ou seja, que as mudanças estruturais da mais poderosa economia do planeta, integre-se na revolução mundial das relações de trabalho, que restitua ao trabalhador a mais-valia que o capitalista amealhou. Ao contrário da indiferença ou da passividade, resistir a toda manifestação de violência praticada pelo preconceito ou ignorância, é ir até suas raízes e extraí-las do solo que as alimenta e possibilita seu convívio social. Nessa jornada internacionalista, inclui-se o Brasil, um país onde o preconceito contra o negro é mais diluído, e menos consciente, mas precisa ser erradicado.

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