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O bolsonarismo é uma ideologia híbrida e amorfa, compromissada com um programa de governo conservador. Agrega liberais conservadores, reacionários de extrema direita, segmentos despolitizados da sociedade brasileira e opositores do Partido dos Trabalhadores. Ao pretender proporcionar unidade a essa frente tão ampla quanto discordante, o governo de Bolsonaro é uma colcha de retalhos tecida com reivindicações que somadas não se integram em uma unidade ideológica coesa, mas mantém-se unida pelo repúdio às esquerdas, e pelo magnetismo de mais um inventado salvador da pátria. Sustentado por um partido sem uma ideologia definida, e coeso pelo compromisso de apoiar o presidente da República, Bolsonaro tem o apoio do outrora socialdemocrata PSDB, dos partidos corporativistas de centro, especialistas na prática do “é dando que se recebe”. Os resultados dessa política surrealista começaram a surgir já no início do atual governo, através dos impasses ocorridos no interior da equipe presidencial, ou nas declarações públicas do presidente. Vários integrantes do primeiro escalão governamental caíram, algumas iniciativas presidenciais ficaram sem efeito devido ao esdrúxulo dos seus conteúdos, e algumas das opiniões presidenciais caíram em descrédito e se integraram ao fértil folclore político nacional. Diante deste desafinado início de governo, o prestígio popular de Bolsonaro diminuiu, e o desapontamento só não é maior devido à irredutível fidelidade dos bolsonaristas obstinados, ou à despolitização de parcelas do seu eleitorado. O ministro da Fazenda, Paulo Guedes, é um liberal conservador, Sérgio Moro, o ministro da Justiça, um bom menino, Olavo de Carvalho, o ideólogo do presidente, é um místico declarado, e o vice-presidente, Hamilton Mourão, é um militar moderador, que compõe a ala mais arejada do governo. Embora seja prematura uma opinião sensata do futuro do governo de Bolsonaro, alguns exemplos históricos mais recentes do andamento da política nacional indicam que a avaliação do presidente será uma alternância de marés altas seguidas de baixas marés, reguladas pelos erros e acertos do governo. Entretanto, está evidente que um governo conservador é sempre um retrocesso histórico, pois suas soluções decorrem de uma visão retrógada dos problemas sociais, mas cimentam as brechas deixadas pelos governos reformistas, sôfregos de mudanças e avanços, e cegos às demandas dos segmentos conservadores da sociedade. Reforma tributária sem ganhos para os trabalhadores, escolas militarizadas, disposição para armar segmentos da sociedade, proposital descaso com a preservação ambiental ou indiferença com as reivindicações das minorias sociais, são recuos propositais de um programa conservador. Este programa é um compromisso com soluções que o avanço da sociedade ainda mantém insepultas, mas transformá-las em prioridades de um governo significa tentar deter a progressiva dinâmica social do país. Bolsonaro tem o apoio de parcelas dos trabalhadores, mas governa para a sua base de apoio centrada nos meios empresariais e nas classes médias brasileiras, concebendo suas reivindicações políticas como um programa nacional válido para o conjunto da sociedade brasileira. Com esta estratégia, o atual governo reproduz a velha tática dos governos corporativistas, transformando os interesses de uma classe social como representação nacional. E poderá temporariamente ser bem sucedido neste seu propósito, garantindo-se no poder através da sedução que exerce nas classes empresariais e nas classes médias hipnotizadas pelas promessas liberais do ministro Paulo Guedes, a locomotiva do bolsonarismo. Mas todo governo conservador, ao postergar as ações públicas coerentes com as necessidades da dinâmica social, agrava a situação econômica do conjunto da sociedade, jogando o peso maior da crise sobre as classes trabalhadoras. Mas por enquanto tudo é festa na terra descoberta por Cabral, avivada pela eficiente propaganda governamental, cuja tônica é bombardear a opinião pública de que a reforma tributária, seguida de outras reformas já anunciadas, conduzirá ao desenvolvimento bem distribuído a toda sociedade. Os índices recentes da bolsa de valores e as oscilações do dólar acalentam essa esperança, mas os preços das mercadorias no supermercado, ou o alto índice de desemprego, indicam outra direção.

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