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Bolsonaro é um conservador convicto, mas que exibe-se como pragmático para equilibrar-se no poder. Apesar dos seus disparates frequentemente emitidos, costura os retalhos do seu projeto de governo sondando o campo minado, que se opõe aos seus arroubos. Como encontra muita resistência na sociedade e no Congresso, navega ao sabor do possível, mas sabendo ao qual porto pretende chegar. Se continuar navegando de acordo com a direção dos ventos, seu governo terá uma desbotada coloração de aparência centrista, distante do vermelho da esquerda e bem mais próxima do verde-amarelo da direita. Neste caminhar, Bolsonaro desagradará seus eleitores reacionários de extrema direita, que propõem soluções autoritárias para os problemas da sociedade brasileira, mas afagará esses extremistas truculentos com algumas medidas de sabor fascista, como o projeto de Escola Militarizada. Impulsivo mas ressabiado, Bolsonaro sabe que este projeto pedagógico tem a oposição não apenas dos setores educacionais, mas também da maioria da sociedade. Diante dessa ampla resistência, cozinhará esse projeto em água morna para não se divorciar dos seus eleitores reacionários, e na hora do almoço poderá servir ao conjunto da sociedade um projeto educacional bicéfalo, uma pizza meia mussarela e meia catupiri, que mudará tudo sem mudar nada, pois um projeto de reforma educacional estrutural não é assunto de palanque eleitoral ou para palpiteiros desinformados. Escola militarizada funciona para fins militares, sendo bem sucedida nos cursos de formação de oficiais das Forças Armadas. Mas para a sociedade civil a educação tem finalidades mais amplas que as ensinadas nos cursos profissionalizantes, pois o cidadão profissionalizado necessita de uma formação cultural abrangente para compreender a complexidade da vida civilizada. O que os bolsonaristas de extrema direita entendem por Escola Militarizada é uma escola rigorosamente disciplinadora, de feição autoritária, próxima dos padrões da Escola que funcionou até os meados do século passado. Mas esta nostalgia voluntariosa dos bolsonaristas da extrema direita é uma visão deturpada daquela escola tradicional, pois seu rigor disciplinar não escondia seu lado fracassado, demonstrado pelo alto nível de repetência dos alunos não assimilados por aquele critério de educar. Quando os bolsonaristas de extrema direita defendem uma Escola Militarizada, não consideram que a Escola tradicional e disciplinadora era uma estrutura educacional adequada aos padrões culturais da sua época. Naquela escola, além do seu civismo exaltativo de pós-guerra mundial, predominava uma visão humanista herdada da Renascença, mas temperada com o sabor da doutrina católica porque esse padrão cultural permeava a sociedade brasileira ainda de formação rural. Educando em uma sociedade com alto nível de analfabetismo, a Escola Tradicional era uma seletiva aventura cultural muito cobiçada, e os ensinamentos que transmitia constituíam uma novidade transformadora para seus alunos. Embora transformadores, seus ensinamentos eram de difícil assimilação para os alunos, motivando uma alta evasão escolar. Incapaz de sustentar seu rigor disciplinar diante do acelerado processo cultural renovador ocorrido na sociedade brasileira a partir dos anos 60 do século passado, a Escola tradicional perdeu seu controle sobre seus alunos, e lentamente começou sua fase desagregadora, apesar das muitas tentativas de mudanças educacionais de sucessivos governos para reaglutiná-la. A atual crise do sistema educacional brasileiro oferece espaço para inúmeras soluções, das mais sólidas até às mais equivocadas, como é o caso da proposta de criar a Escola Militarizada. Movidos pelo processo global de mudanças culturais, outros países enfrentam suas crises educacionais com relativo sucesso, através de projetos pedagógicos mais amplos, que propõem, entre outros, a participação ativa dos alunos nos processos de aprendizagem, a partir de suas vivências inseridas no contexto sócio-cultural onde vivem. É esta uma proposta educacional polêmica, mas está obtendo sucesso onde é aplicada, pois insere-se no processo de democratização contínua da sociedade contemporânea. No Brasil, entretanto, estas experiências são pequenos oasis perdidos no conjunto da inércia da sociedade quando o assunto é melhorar a educação. E para superar esse marasmo, o ponto inicial não é militarizar nossas escolas, mas começar pela escola em tempo integral, pois o que falta para os alunos é um ambiente escolar mais amplo, onde adquiram com mais solidez a cultura que os capacitará para a vida em uma sociedade democrática e participativa. Propostas como facilitar o uso de armas pela população, degradar o meio ambiente em nome de um desenvolvimento agressivo e estabelecer a Escola Militarizada caminham juntas no rumo de uma sociedade retrógada e autoritária, e se efetivadas anularão até as soluções mais sensatas que os bolsonaristas moderados esperam do seu astuto presidente.

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